Ecovida recebe mais de 80% da verba destinada à restauração da Duna Dama Branca, em Cabo Frio

A denúncia sobre o suposto favorecimento financeiro do Instituto Ecovida, entidade não governamental responsável pelas obras de restauração e revitalização do Parque Dormitório das Garças, em Cabo Frio, marcou o Dia do Meio Ambiente, festejado mundialmente em 5 de junho, na cidade. Contudo, o mês ainda não chegou ao fim, tampouco as denúncias ligadas ao Instituto. Desta vez, o alvo é o Duna Viva, que tem como objetivo conservar e restaurar as áreas degradadas da região da Duna Dama Branca, localizada no Parque Estadual da Costa do Sol.

De acordo com Juan Gomes, coordenador técnico do projeto Duna Viva, o programa teve início no dia 15 de janeiro deste ano e tem prazo de dez meses, chegando ao fim 15 de novembro. Salienta-se que, conforme o projeto, inicialmente, a previsão era que os trabalhos acontecessem entre agosto de 2023 e setembro de 2024.

O plano foi colocado em prática a partir de uma emenda parlamentar de R$ 1.629.208 da deputada federal Talíria Petrone (PSOL). O que chama a atenção neste valor é que é exatamente o mesmo destinado às obras do Dormitório das Garças.

Apesar das duas emendas possuírem os mesmos valores globais, as diferenças entre as propostas são nítidas. A primeira é que, mesmo atrasado, o da Duna Dama Branca já começou. A segunda é que o plano do Dormitório das Garças aloca 48% do orçamento total para estruturar a equipe do Instituto Ecovida para atuar no projeto. Já o da Duna destina R$ 1.313.808,58, o que equivale a aproximadamente 81% do total da emenda parlamentar, restando apenas 19% para a execução dos trabalhos.

Vale pontuar que, desse montante, R$ 1.194.891,88 é destinado para contratar consultorias e assessorias necessárias para o programa, ou seja, aproximadamente 91% do total do orçamento. Desse valor, R$ 1.138.891,88 destina-se à contratação de Recursos Humanos. Nenhuma nota fiscal neste valor foi identificada no Portal de Transparência.

Entretanto, em diferentes valores, foi possível identificar, através das notas fiscais disponíveis no Portal, que a empresa contratada para atuar na área de Recursos Humanos foi o Instituto de Gestão Setorial (IGS). É importante salientar que o CNPJ dessa empresa se limita a atividades de contabilidade, corretagem de seguro e consultoria em gestão empresarial. Os valores começaram a ser repassados antes do início das atividades.

Chama a atenção, inclusive, a descrição das notas fiscais do IGS, que, em momento algum, mencionam o trabalho na área de Recursos Humanos.

Para melhor compreensão, é importante salientar que o plano de trabalho dos programas do Instituto Ecovida são divididos por metas, que explica os objetivos a serem trabalhados durante o projetos, e “submetas”, que são os itens a serem comprados dentro de cada meta. O documento não tipifica o nível de importância, mas estabelece a quantia a ser destinada para cada uma delas.

Dito isto, neste projeto ficou estabelecido que a primeira meta é estruturar a equipe do Instituto EcoVida para trabalhar no planejamento. Anteriormente, foi mencionado que cerca de 81% do orçamento total é destinado para esta parte.

Vale pontuar que, de acordo com o Portal de Transparência, desta quantia, R$ 1.194.891,88 serve para a contratação de consultorias e assessorias necessárias ao projeto. Estes tópicos representam a primeira parte da meta inicial. Já o montante de R$ 36 mil é destinado para a contratação de um assessor de imprensa durante um ano. A reportagem, inclusive, tentou contato com a responsável pela comunicação do programa por mais de uma vez, mas não obteve qualquer retorno.

A segunda fase da primeira meta consiste em equipar a equipe. O primeiro tópico consta na informatização da equipe do Instituto Ecovida para atender ao programa. O valor destinado à esta etapa é de R$ 45.116,75. Dentre as compras inclusas neste tópico constam mouse box com fio Usb MO255 Multilaser, mouse pad slim e notebooks i5, 256 ssd e 8 gb de ram.

A terceira fase destina a quantia de R$ 73.800 para a compra de um veículo, com o objetivo de garantir a mobilidade e a logística da equipe do projeto. No caso, o valor é destinado à compra de um quadriciclo tipo OHV modelo Ventura M50L + carreta de reboque com adaptação para quadriciclo avaliado em R$ 63.872. Os R$ 9.928 restantes seriam destinados para o abastecimento do automóvel.

Algumas questões chamam a atenção neste tópico. A primeira é a nota fiscal de compra do quadriciclo, disponível no Portal de Transparência. Apesar do projeto destinar o montante de R$ 63.872 para a compra do veículo, o documento mostra que ele foi adquirido pelo valor de R$ 55.290.

A quantia “sobressalente” de R$ 8.582, na teoria, seria destinada, na íntegra, para a compra da carreta de reboque, cujo objetivo é o transporte das mudas, mourões e afins. O problema é que, de acordo com a nota fiscal do produto, que foi comprado com mais de um mês de diferença do quadriciclo, mostra que a mesma custou R$ 4.500. Ou seja, conforme os dados oficiais, sobrou o valor de R$ 4.082, do qual não foi dada qualquer justificativa por parte do Instituto para que finalidade foi utilizado.

A outra questão é que a meta é bem específica quanto seu objetivo, que é garantir a mobilidade e a logística da equipe do projeto. Neste ponto, o que chama a atenção é a existência de um acordo de cooperação técnica assinado pela prefeita Magdala Furtado (PV) no dia 27 de março dese ano e pelo Instituo Ecovida, pouco antes do desligamento de Rosalice Magaldi Fernandes da Secretaria de Meio Ambiente da cidade.

Na cláusula quarta do documento, que representa as atribuições do município de Cabo Frio, executadas pelo Instituto Ecovida, no que diz respeito ao Projeto Duna Viva, fica descrita que a prefeitura está cedendo, além da edificação localizada na parte frontal do Horto Municipal para sede administrativa do programa, a cessão de um carro alugado no modelo Volkswagem Saveiro cabine dupla até 2025.

Ou seja, além do gasto menor do que o pretendido com o automóvel, o Projeto Duna Viva ainda conta com veículo cedido gratuitamente pela prefeitura. Veja o documento: 

Sobre a questão do automóvel, o coordenador técnico do projeto disse à reportagem que houve uma complicação burocrática para sua aquisição.

De acordo com Juan, “segundo as diretrizes do MMA, o veículo deveria ser adquirido no estado de origem do CNPJ do gestor da emenda, o que, no caso do Instituto, é o Amapá, o que impossibilitou sua aquisição, pois teria toda uma questão de frete, emplacamento, enfim. Por isso foi feito o pedido junto ao MMA para a troca do veículo pelo quadriciclo, que também ajudaria nos traslados pela duna. (…) [Ele] fica garageado na sede do Parque Estadual da Costa do Sol, no Foguete”, disse o coordenador, destacando que não possui acesso a valores e a qualquer questão administrativa, e pontuando que “juntamente ao quadriciclo foi adquirido uma carretilha para transporte de mudas, mourões e tal”.

Duna Dama BrancaLudmila Lopes

Duna Dama BrancaLudmila Lopes

Das metas observadas, até o momento, ao que tudo indica, a segunda, que tem como objetivo “conter a ocorrência de acessos e ocupações irregulares”, é uma das mais avançadas.

Avaliada em R$ 87.852,64, a meta propõe o cercamento de 7,6 km do perímetro da duna e a plantação mudas entre os mourões, com o objetivo de conter a passagem de veículos não autorizados. Neste ponto, é importante mencionar que existe uma divergência entre a proposta, que apresenta um número de mudas a serem plantadas (1 mil), e o plano de trabalho, que propõe outro (500).

Colocação dos mourõesReprodução
Colocação dos mourõesReprodução
Apesar disso, chama a atenção o fato de que a colocação dos mourões foi realizada em totalidade, conforme publicado nas redes sociais do Ecovida nesta quarta-feira (19). A colocação deles, inclusive, também foi registrada e publicada nas redes sociais em outros momentos, como entre os dias 18 de abril e 27 de maio. Uma equipe do Jornal O Dia esteve no local e percorreu a área, confirmando que, de fato, o perímetro foi cercado.

O que não foi observado, no entanto, foi a quantidade de mudas mencionada. A plantação, até o momento, foi feita apenas no início, próximo à entrada do Parque Estadual da Costa do Sol.

À reportagem, Juan explicou que, até o momento, entre os mourões, foram plantadas cerca de 90 mudas de aroeira, pitanga e araçá-da-praia, todas espécies nativas de restinga. O coordenador técnico disse também que, “daqui a mais ou menos um mês [a equipe realizará] podas drásticas nessas mudas, pois estão muito grandes para aguentar as condições climáticas da nossa região”.

Esclareceu, ainda, que, nesse trecho, serão plantadas ao todo cerca de 300 mudas e que as equipes estão aguardando as condições climáticas melhorarem para o plantio do restante.